Sebastião Rodrigues Gonçalves
Marxismo e Educação foi o tema da palestra proferida por Michael
Lowy,
nos dias 05 e 06 de novembro, na UNIOESTE, Campus de Foz do Iguaçu. Lowy,
atualmente está em Paris, trabalha na Escola de Altos Estudos Em
Ciências Sociais de Paris, é Diretor de Pesquisa do Centro Nacional de
Pesquisa Científica da França. Entre as obras publicadas estão: Método
Dialético e Teoria Política, pela editora Paz e Terra; As Aventuras de
Karl Marx contra o Barão de Münchhausen, editora Busca Vida e A Guerra
dos Deuses: Religião e Política na América Latina. Este último recebeu
o prêmio Sérgio Buarque de Olanda, pela categoria ensaio, cujo prêmio
foi doado pelo autor ao MST - Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem
Terra. Lowy estava no Brasil trabalhando no programa de Pós Doutorado da
USP – Universidade de São Paulo, por essa razão foi possível estar em
Foz do Iguaçu nesta nessa data, para dar sua contribuição teórica à
comunidade Acadêmica.
No dia 05 de novembro, foi uma palestra para o público
em geral, onde abordou o tema marxismo, os problemas do capitalismo e os
desafios posto para a humanidade. Lowy, iniciou sua palestra com uma
ironia àqueles que acham que Marx está superado. No dia 06 a palestra
foi para um pública mais restrito, professores e acadêmico que também
fazem pesquisa, o tema abordado foi “Marxismo e a produção do
conhecimento científico. Segundo
ele, “após a queda do muro de Berlim muita gente acha que acabou o
marxismo e a teoria socialista, como se o marxismo e a teoria socialista
tivesse iniciado com a construção daquele muro”. Aliás a construção
do muro foi uma contradição à própria teoria do Materialismo Histórico,
comentou ele.
Segundo Lowy, Marx se diferenciou de outros
pensadores socialistas pelo método, pois, não foi ele o primeiro a
defender a sociedade socialista. Os primeiros, foram os socialistas utópicos,
que achavam possível um socialismo implantado pelo Rei, ou seja, na visão
dos socialistas utópicos, somente o poder centralizado seria capaz de
implantar o socialismo. Assim, o Rei ao implantar outro modelo econômico
resolveria os problemas da miséria. Em síntese, eles tinham a ilusão
que mudar o modelo econômico era apenas uma questão de vontade do Rei,
por ser ele (o Rei) quem detinha o poder. Citou como exemplo Fourie, que
“mandou carta para o Rei da França”, sugerindo que ele deveria
implantar o socialismo naquele país; como não recebeu nenhuma resposta,
“mandou outra carta para o imperador da Rússia”, mas também não
recebeu resposta.
Outra corrente do socialistas modernos, eram os
materialistas, conhecidos como “materialistas
mecanicistas”. Entre eles está Friederic Feuerbach. Estes não
acreditam no poder central, mas também não acreditam que as transformações
da sociedade dever ser obra daqueles que precisam das mudanças. Para
eles, apenas um grupo de intelectuais iluminados tomariam o poder e depois
organizariam a economia do Estado conforme as necessidades do povo. Marx e
Engels inauguram uma terceira corrente do pensamento socialista, trazendo
o Materialismo Histórico e a Dialética dentro da categoria da totalidade
como método de análise da sociedade.
Os primeiros a defender uma sociedade socialista,
estavam baseada na crença de um poder divino (Deus). Porém, eles não
provam a existência desse poder, apenas fazem uma aposta. Essa aposta tem
o valor da vida, porque tudo o que se pratica, toda a atividade, toda a ação,
está fundamentada nessa crença. Se o sujeito perde a aposta, ele perdeu
toda sua vida, se ele ganhar a aposta, da mesma forma ganha a vida e também
a eternidade (o paraíso). O ateu, também faz sua aposta, só que ao
contrário dos cristãos eles apostam na não existência de Deus, e da
mesma forma suas atividades da vida representam essa visão de mundo. Se
ele ganhar a aposta, significa que ele ganhou o mundo porque aproveitou
bem a vida e não correu o risco de ir para o inferno depois de morto. No
mesmo sentido os socialista de origem marxista orientam suas ações da
vida real apostando que suas atividades devem contribuir para que o futuro
da humanidade seja sociedade socialista.
Outro elemento que Michael Lowy trouxe para o
debate, foi o conceito de “Democracia”. Enquanto a burguesia defende
apenas uma democracia política, na sociedade socialista a democracia é
também econômica. O conflito entre as várias correntes de socialistas não
está no fim último da organização da sociedade, mas no processo de
transição. Aqui novamente ele apresentou três tendências metodológicas
para a análise da sociedade. A primeira, é a tese do fim da história
defendida por Fukuiama, que o capitalismo é uma força natural e aos
seres humanos não resta outra alternativa a não ser compreender a lógica
dessa força para aperfeiçoa-la e melhorar as condições de vida. A
segunda tese, diz respeito aos que acreditam que o fim da história não
é o capitalismo, mas sim o
socialismo, baseado na tese de que “tudo o que nasce morre”, assim no
momento em que o capitalismo apodrecer de velho pelas suas próprias
contradições ele desaparecerá. Nesta perspectiva, há uma visão que
“a história está em linha reta”, como um trem, que teve um ponto de
partida e terá seu ponto de chegada que é o socialismo. Para a
humanidade, resta duas alternativas: ficar parado esperando o trem da história
passar e chegar no socialismo ou dar um empurrãozinho para o trem da história
andar um pouquinho mais rápido e assim chegar na estação do socialismo.
A terceira tendência está fundamentada nas teses do “Socialismo ou
Barbárie” de Rosa Luxemburgo,
que a história não está em linha reta; as condições para o socialismo
não estão dadas pelo próprio capitalismo e tudo depende das circunstâncias.
O que significa dizer, que no entendimento de rosa Luxemburgo, pelo método
de análise da história de Marx e Engels, as condições não estão
dadas para a história evoluir em direção ao socialismo. Essa
perspectiva é um convite aos militantes para atuarem politicamente na
organização dos partidos, pois a história caminha em direção ao
socialismo, se o proletariado tiver força suficiente para superar o
modelo econômico capitalista ou a história caminha pela segunda
perspectiva que será em direção
a barbárie com o aperfeiçoamento do capitalismo.
A última perspectiva de análise trabalhado na
sexta feira (05/11/04), vai na mesma linha do método de Rosa Luxemburgo,
mas Lowy acrescenta, não a barbárie na perspectiva de Luxemburgo, mas a
catástrofe na perspectiva dos ecologistas. Como o capitalismo não
conhece limites e o fim último da ação humana neste modelo econômico
é sempre para atender as perspectivas da economia, da riqueza e do
capital, então há uma grande possibilidade de uma catástrofe da
natureza e com grande possibilidade de um descontrole por parte da
humanidade. Como exemplo citou a grande industria bélica dos EUA, que
sustentam a parte da economia americana.
Citou também a probabilidade do câncer de pele produção dos
raios ultravioletas produzido pelo buraco da camada de ozônio;
os riscos que os trasngênicos podem provocar ao meio ambiente e a
saúde humana. Porém, tudo isso tem o aval do capitalismo a exemplo dos
cientistas que provaram que os transgênicos são prejudicial à saúde e
ao meio ambiente todos ficaram desempregado porque suas teses não
interessava ao capitalismo.
Método
da Pesquisa Científica Em Ciências Sociais
O marxismo, o materialismo histórico e a produção do
conhecimento científico é o dilema que estamos vivendo nestes últimos
tempos. Não há consenso entre os marxistas sobre o método de análise
da história, da sociedade e da produção do conhecimento científico. As
principais divergências estão nos métodos de análise da estrutura
social e da dinâmica do funcionamento da sociedade. Há uma forma de
analisar a sociedade, que se apresenta como um esquema de uma máquina,
com rodas e engrenagens que giram movidas pelas forças produtivas.
Segundo Lowy, essa é “uma caricatura mecânica e muito pobre para
analisar o processo histórico da sociedade”. A economia é o motor que
coloca em funcionamento todas as outras engrenagens, interferindo no
processo político e ideológico da sociedade. “Isso é tudo o que não
é”, porque “falta os seres humanos no processo”.
“A luta de
classe não se move com uma manivela”. A contra argumentação dessa
deste pensamento “está sintetizado já em 1845 nas teses sobre
Feuerbach”, acrescenta que no pensamento de Engels, aqui está o
“Germe genial de uma nova concepção de mundo”, porque ali está a
representação da “filosofia da práxis”. Entre os pensadores que
interpretaram a filosofia da Práxis está Antônio Gramisci,
que explica que a filosofia da práxis é histórica, um conceito contrário
ao pensamento baseado nos mitos da religião. “A filosofia da práxis é
históricista”, enquanto o pensamento religioso é mitológico, é “a-histórico”,
porque se fundamenta na “idéia de eternidade”. É “uma categoria
desvinculada do processo histórico”. É com esse método que “a
burguesia explica que o capitalismo é um fenômeno natural”, enquanto
para Marx “é um fenômeno histórico e social”. Isto é, começou em
um determinado momento da história e pode acabar em outro momento.
Outro elemento acrescentado por Gramsci, segundo
Lowy, é que “Marx é humanista”, porque “são os seres humanos que
fazem sua própria história”, isto é, “o homem faz sua própria história”,
lembrando também que Marx cita Vico, filósofo italiano pouco lido por nós,
mas segundo Vico, “os homens fazem sua história pela filosofia da práxis:
ação social, que é individual e coletiva”. Ainda no pensamento
gramisciano, “Marx é um materialista, porque entende que não são os
espíritos e nem a religião que faz a história; são os fatores
materiais, pelo fato que o ser humano precisa assegurar as condições
materiais de vida, o ser humano precisa produzir”. A produção material
é a própria produção da existência humana. Ao produzir a existência
o ser humano produz também sua cultura, sua religião etc.
Lukacs foi outro pensador comentado por Lowy, que
trouxe para reflexão a dialética na categoria da totalidade. Exemplo, a
“educação não é um fenômeno isolado da totalidade”. Acrescenta
que os fenômenos sociais na categoria da totalidade não são fatores
isolados, embora, havendo uma “autonomia relativa das diferentes esferas
da vida social”, no entendimento de Lucien goldman”. Na concepção
Max Weber, “toda a esfera da vida econômica é inseparável, porém com
a modernidade houve uma separação onde cada esfera vai seguir seu próprio
caminho”, a política, a economia e a religião, gerando a
“possibilidade de conflitos”. Para Lukacs e Goldman, “isso não é
verdade, porque cada esfera é parte de uma totalidade”. Pois, “existe
uma autonomia relativa”, embora cada esfera “seguem algumas regras
específicas”, mas por fazer parte de uma totalidade as regras específica
sempre obedecem em última instância as regras gerais “por fazer parte
da categoria da totalidade.
Há também uma “tendência ao reducionismo que não
reconhece a autonomia relativa das esferas da produção do conhecimento
científico”. Em Max Weber por exemplo: há “individualismo metodológico,
os indivíduos e seus motivos” dissociado das relações sociais. Em
Goldman, os “sujeitos são transindividuais, são as classes sociais e
seus conflitos”. Então, “as classes sociais são os elementos
centrais para entender a sociedade. Os indivíduos fazem parte das classes
sociais”. O indivíduo, o escritor, o artista, o teólogo etc. poderão
estar amparado numa dessas três visão de mundo: visão do cristão, visão
do mudo positivista e a visão dialética materialista.
O que há de novidade no materialismo histórico é
“as lutas de classe”. Ao contrário dos Neohegelianos, que viam na
religião uma projeção, uma invenção para a “manipulação da essência
humana. Isso significa que o método marxista não é “a-histórico”;
pois, “todas as transformações, inclusive a história da religião tem
a ver com as lutas de classes. Lembra que um pensador chamado Thomas Münzer,
citado por Engels reconhece “nos conflitos religiosos suas relações
com as classes sociais”. O que significa dizer que há uma autonomia
relativa também na esfera do pensamento religioso.
Produção
do conhecimento c
ientífico
O conhecimento construído pela humanidade segue a mesma lógica,
“o processo histórico social, tem a ver com os fenômenos sociais”.
Assim, “a produção do conhecimento científico, dentro da totalidade
reconhece a autonomia relativa maior ou menor” graus dependendo das
circunstâncias. Mas levando em consideração as lutas de classes, há
diferença entre as “ciências da natureza e as ciências sociais e políticas”.
Nas ciências da natureza “é possível o consenso entre a química, a
astronomia, a matemática, porque não há uma química da burguesia e uma
química do proletariado; uma astronomia da burguesia e uma astronomia do
proletariado” Embora, já houve momento de manipulação, como o tempo
de Galileu com suas “teses heréticas que a igreja não concordava
condenando o à fogueira”. Mas hoje isto não é mais possível. Já nas
ciências sociais estes conflitos são mais patentes.
Lowy considera que não existe
neutralidade em relação à manipulação das ciências. Por exemplo na
área da “climatologia” o comitê internacional aparentemente neutro
mostra o acúmulo de gás carbônico na estratosfera, produzindo risco de
câncer, mas a climatologia dos EUA, é pró americana e prova ao contrário
para amenizar os conflitos. Esta pretensa neutralidade axiológica do
cientista social está em Max Weber, que defende a tese de que a
neutralidade depende do “estado de espírito do cientista”, que o
“cientista social deve se colocar no mesmo estado de espírito do químico
e do físico”. Isto do ponto de vista humano é impossível, porque o
ser humano carrega consigo os preconceitos adquirido ao longo da história.
A posição de Marx,
apresenta um método superior pelo seu horizonte de classe. Enquanto, os
pensadores da burguesia usam o método científico no estrito limite de
sua classe, há os pensadores vulgares que vendem seus métodos de análises
para a burguesia. Assim, “os clássicos não conseguem extrapolar os
limites de seu horizonte de classes”. Marx em: “a crítica da Economia
Política, representa o proletariado e supera os limites da visibilidade
burguesa”. Sem negar o próprio método utilizado pelos clássicos:
Ricardo e Adan – Smith, mas vai além das leis da economia burguesa o
que permite a superioridade do método. Citou também Louis Althusser: que
diz que “Marx foi para as ciências sociais o que Galileu Copernico foi
para as ciências físicas. Em Marx á história não está em linha reta.
Há uma continuidade descontínua, é essa descontinuidade, que permite o
corte epistemológico na história e no pensamento marxista.
Para concluir
lembrou que a “há uma ruptura na economia política clássica, que o
processo de produção do conhecimento é inseparável dos interesses econômicos”.
Há uma autonomia própria mas existe apoio da relação do processo
social, histórico e as lutas de classes. O maior exemplo é a produção
dos transgênicos, que já está comprovado o risco para o ser humano e o
meio ambiente, mas todos “os cientistas que tomaram posição contrária
à produção de transgênicos foram demitidos de seus empregos”. Assim
sendo, podemos analisar que a ciência não é um ente isolado,
independente do interesses econômicos. Principalmente, no momento que
tudo está sendo medido pelo critério de produtividade científica, que
coloca as universidades e os professores pesquisadores na lógica da
competitividade.
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